Eu, meu pai e uma história

Sobre experiência do usuário, do cliente, do paciente, do freguês, das relações humanas.

Thaís Haro
3 min readJun 27, 2021

Eu sou UX Writer, licenciada em Letras. Meu pai, analfabeto e construtor civil.
Aos 12 anos, ele ouviu a seguinte fala de um médico para a minha avó:

“Ensina uma profissão pra esse menino porque ele não vai prestar para os estudos”.

Hoje ele tem 56, e essa frase ainda é viva na mente e na vida dele.

Quando me deparei com essa foto na rede vizinha, lembrei do homem que me inspira e me ensina todos os dias, mesmo não sendo alfabetizado. Fiquei emocionada com a sensibilidade dessa médica. Por isso, tive vontade de compartilhar a história do meu pai por aqui, que é um pouco desconfortável para mim, confesso. Mas me inspira a ser melhor na vida e no trabalho.

Meu pai conta que repetiu por volta de 6 vezes a primeira série. Por algum motivo, a educação falhou na vida dele. Seja por não investigarem o porquê da dificuldade, seja por não reconhecerem quais eram as suas reais necessidades, seja por falta de informação ou condições. Simplesmente, falhou. Ele fala que não conseguia aprender e sentia uma dor no peito quando ouvia o sino da escola tocar.

Depois que desistiu, perdeu o interesse definitivamente. Nada mais o convence de tentar aprender. Isso é triste para mim, pois também sou professora e apaixonada por tudo o que envolve educação. Eu insisti por algum tempo, mas vi que aprender a ler e a escrever se tornou sinônimo de sofrimento para ele. Meu pai desenvolveu o seu próprio método para resolver suas situações e faz isso muito bem, inclusive com a tecnologia. Ele é curioso, inteligente, criativo e divertido.

A vivência com meu pai me lembra, diariamente, que não importa quantos títulos profissionais ou acadêmicos eu tenha ou venha a conquistar, quando eu me sento para tomar café com ele, eu falo a língua dele. Assim também, na hora de oferecer o meu serviço ao outro, devo lembrar de colocar o meu ego no bolso, ouvir como se estivéssemos tomando um café e entender quais são suas necessidades e problemas.

Parece uma história boba de família, mas, veja bem, é sempre bom lembrar que empatia é um princípio básico para se aplicar à experiência do usuário, do cliente, do paciente, do freguês, das relações humanas. Os bons modelos de negócios se preocupam em resolver as dores das pessoas.

“Quando seus consumidores compartilham suas histórias pessoais, eles não estão apenas compartilhando suas dores. Na verdade, eles estão te ensinando como criar negócios, produtos e serviços melhores.” Kristin Smaby, “Being Human is Good Business”

Meu pai escolhe música no YouTube como se estivesse pedindo para um locutor de rádio: “manda uma moda de viola pra mim aí!” e sempre dá certo… Isso não é acessibilidade? Mas essa história eu deixo para um outro dia.

A quem leu até aqui, meu muito obrigada ❣️
@thais.haro

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